segunda-feira, 19 de maio de 2014

Ethos Russo

"Todo ato de tomar a palavra implica a construção de uma imagem de si. Não é necessário que o locutor faça seu auto-retrato, detalhe suas qualidades nem mesmo fale explicitamente de si."
SEU ESTILO:
SUAS CRENÇAS IMPLÍCITAS:
 SUAS COMPETÊNCIAS LINGUÍSTICAS E LITERÁRIAS
 
     Quando penso em Dostoiévski quase sou feliz. Vê-lo?!... Seria a realização de um sonho... desses que guardamos apenas por teimosia, porque Dostoiévski é uma paisagem que faz com que a Terra seja um local habitável. E, sendo assim, posso caminhar na areia da praia esperando o entardecer sem pressa e sem medo.

     Quando leio Dostoiévski sou feliz porque o Sol deixou de ser uma ideia e passou a ser música que embala meus olhos. Sinestesia de vida. Sou feliz nesta condição humana que remete a conquistas seculares: mitos, mistérios, apropriações de sentidos que conjugados conspiram encantamentos em proporções gráficas lineares que percorro com os olhos numa audiência de páginas infinitas. Páginas, tantas páginas até encontrar Raskolnikov e, ao encontrá-lo, entendo a complexidade humana. Mosaico de beleza e dor. Fronteira entre razão e consciência: o crime na forma mais humana possível. Uma degradação quase aceitável nesta dialética russa capaz de me fazer esquecer o Brasil. Saudades da Rússia!...

     Quando leio Dostoiévski a metonímia abandona sua essência porque não substitui a Ponte que percorro com meu amado. Mãos dadas. São Petersburgo se tornou real, prende-me, acolhe-me. Metáfora verdadeira: sou platéia pura, toda crente, toda olhos, toda emoção. Frio que me aquece é puro paradoxo de identidade.

     O escritor não desmente sua natureza clássica. É nobre, é vivo e encanta muito além desta filosofia pós-moderna. Era fragmentada e torpe. Ele, na sua generosidade, deixou-me uma herança chamada Literatura. Aliança perfeita entre nós. 

     QUANDO é o que tenho hoje para abrigar os verbos pensar e ler. Quando penso em Dostoiévski corro e pego o livro. Ler é o que tenho. Ethos russo que me embriaga nesta cadência sonora. Sua presença é o próprio logos configurado em romance. Assim, é possível que uma lágrima seja testemunha dessa emoção chamada leitura: lógica de pathos. 

     Ler Dostoiévski é maior que a Terra e o Sol. É Metonímia de vida flagrada nestas linhas onde minha identidade se espalha. Ternura cognitiva.

     Quando penso, quando leio Dostoiévski: Existo!
    
                                                  Luzia Almeida

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